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Caso Evandro: com anulação das condenações, o que acontece agora?

A anulação da condenação dos acusados de envolvimento na morte do menino Evandro Ramos Caetano, em Guaratuba, gera dúvida sobre quem são os verdadeiros culpados pelo crime e o que pode acontecer agora.

Em 1992, o menino de seis anos de idade sumiu no trajeto entre a casa onde morava e a escola, e foi encontrado morto com sinais de violência extrema. Relembre abaixo.

Sete pessoas foram acusadas pelo crime e quatro foram condenadas. Na última quinta-feira (9), por três votos a dois, todos os condenados tiveram os processos anulados pelo Tribunal de Justiça do Paraná (TJ-PR). Com isso, Beatriz Abagge, Davi dos Santos Soares, Osvaldo Marcineiro e Vicente de Paula Ferreira – falecido em 2011, no presídio – passam a ser, na prática, inocentes.

Para a maioria da Corte, áudios de fitas descobertos pelo jornalista Ivan Mizanzuk, e aceitos como novas provas a pedido da defesa, mostram que os réus confessaram os supostos crimes mediante tortura e cumprindo ordens.

Eventuais culpados podem ser responsabilizados?

Mais de 30 anos depois do caso, Francisco Monteiro Rocha Júnior, advogado criminalista e professor de Direito Penal da Universidade Federal do Paraná (UFPR), não acredita que os eventuais culpados sejam responsabilizados.

“Poderia ser reaberta uma investigação, mas eu tenho a impressão de que em virtude do lapso temporal tudo estaria prescrito”, afirma.

O caso pode ser reaberto?

Ele explica que caberia ao Ministério Público do Paraná (MP-PR) a reabertura da investigação do caso.

O g1 questionou o órgão sobre esta possibilidade, mas, até a última atualização desta reportagem, não teve resposta.

Responsável não poderia ser punido porque crime prescreveu

Rocha Junior explica que, caso encontrado, o responsável pelo assassinato não poderia ser punido, uma vez que o crime prescreveu.

O Código Penal brasileiro prevê pena de seis a 20 anos de prisão para o crime de homicídio. Nesse caso, o prazo para que ocorra a prescrição do crime é de 20 anos.

“Já passou muito mais de 20 anos, então não teria condição nenhuma”, explica o advogado.

Ele explica ainda que os prazos para a prescrição de um crime variam de acordo com o andamento do processo.

“A gente tem termos de interrupção no processo. Isso significa que quando atinge aquele estágio começa a contar do zero. A prescrição começa a contar do momento do crime. Quando denuncia, ou seja, quando começa o processo penal, começa a contar do zero de novo. Quando tem a sentença, começa a contar do zero de novo. Quando tem a decisão do tribunal, começa a contar do zero de novo. Até começar a execução da pena, quando começa a contar do zero de novo”, exemplifica.

De acordo com Rocha Junior, como os eventuais culpados não foram nem denunciados, não há chances de serem legalmente punidos.

Tortura poderia ser investigada

O advogado explica que, apesar do tempo, a tortura que os acusados sofreram na época poderia ser investigada. Isso porque, no Brasil, o crime de tortura não prescreve.

Além disso, conforme Rocha Junior, com o reconhecimento de que as confissões aconteceram sob tortura, os acusados poderão solicitar uma indenização do Estado, porque tiveram a liberdade cerceada, ainda que sendo inocentes.

A defesa dos inocentados confirmou a hipótese e afirmou que pedirá na Justiça indenização na esfera cível nas próximas semanas.

“O tribunal já reconheceu o direito à indenização. Vamos estudar e fazer o pedido nas próximas semanas”, informou o advogado Figueiredo Bastos.

O advogado informou que vai, ainda, estudar os parâmetros e determinar os danos para, então, formalizar com o pedido da indenização. Ele ainda não sabe quanto os inocentados irão pedir na Justiça em reais.

Em janeiro de 2022, o Governo do Paraná fez um pedido de desculpas oficial para Beatriz Abagge pelo que o estado definiu como “sevícias indesculpáveis” sofridas por ela à época da investigação do caso.

“Expresso meu veemente repúdio ao uso da máquina estatal para prática de qualquer tipo violência, e neste caso em especial contra o ser humano para obtenção de confissões e diante disto, é que peço, em nome do Estado do Paraná, perdão pelas sevícias indesculpáveis cometidas no passado contra a Senhora”, cita trecho da carta.

A revisão criminal

Programa conta a história do desaparecimento do menino Evandro, de 1992. — Foto: Reprodução/RPC

Programa conta a história do desaparecimento do menino Evandro, de 1992. — Foto: Reprodução/RPC

Por 3 votos a 2, os desembargadores anularam o processo de Beatriz Abagge, Davi dos Santos Soares, Osvaldo Marcineiro e Vicente de Paula Ferreira – falecido em 2011.

A revisão criminal serve para reanalisar um caso no qual o réu entende que foi condenado de forma injusta.

Ela pode ser solicitada em quatro casos: quando a condenação foi contrária a uma lei, quando a condenação foi contrária a uma evidência dos autos, quando a condenação foi fundada em uma prova falsa, ou quando houver uma nova prova da inocência do condenado.

Os desembargadores Gamaliel Seme Scaff, Adalberto Xisto Pereira e o desembargador substituto, juiz Sergio Luiz Patitucci, votaram a favor.

Os magistrados chegaram a essa conclusão após fitas de áudio com os indícios de tortura se tornarem públicas na série documental O Caso Evandro, da Globoplay. Os materiais foram obtidos pelo jornalista Ivan Mizanzuk.

Segundo o TJ-PR, os desembargadores Miguel Kfouri Neto e Lidia Maejima votaram contra por entenderem que as fitas precisariam ter passado por perícia.

Não cabe recurso da decisão no TJ-PR. Com isso, todos os condenados podem pedir uma indenização na esfera civil.

Quem eram os acusados

Os sete acusados do Caso Evandro  — Foto: Reprodução/Globoplay

Os sete acusados do Caso Evandro — Foto: Reprodução/Globoplay

Sete pessoas foram acusadas de envolvimento no assassinato:

  1. Airton Bardelli dos Santos
  2. Francisco Sérgio Cristofolini
  3. Vicente de Paula
  4. Osvaldo Marcineiro
  5. Davi dos Santos Soares
  6. Celina Abagge
  7. Beatriz Abagge

Na época, as investigações apontaram que Beatriz Abagge e a mãe dela, Celina Abagge, então primeira-dama de Guaratuba, teriam encomendado a morte do menino em um ritual. Elas passaram mais de cinco anos na cadeia.

Outras cinco pessoas foram incriminadas, entre elas, Davi e Osvaldo, que também foram presos acusados de sequestrar e matar o garoto.

O caso teve cinco julgamentos diferentes. Um dos tribunais do júri, realizado em 1998, foi o mais longo da história do judiciário brasileiro, com 34 dias.

Na época, a Beatriz e Celina foram inocentadas porque não houve a comprovação de que o corpo encontrado era do menino Evandro.

O Ministério Público recorreu e um novo júri foi realizado em 2011. Beatriz, a filha, foi condenada a 21 anos de prisão. A mãe não foi julgada porque, como ela tinha mais de 70 anos, o crime prescreveu.

As penas de Osvaldo Marcineiro e Davi dos Santos se extinguiram pelo cumprimento. O último réu, Vicente de Paula, morreu por complicações de um câncer em 2011 no presídio onde estava.

Desaparecimento de Evandro

O menino Evandro desapareceu em 6 de abril de 1992. À época, o Paraná vivia o desaparecimento de diversas crianças na região.

Segundo a investigação, ele estava com a mãe, Maria Caetano, funcionária de uma escola municipal de Guaratuba, e disse a ela que iria voltar para casa após perceber que havia esquecido o mini-game. Depois disso ele nunca mais foi visto.

Após um corpo ser encontrado em um matagal, no dia 11 de abril de 1992, o pai de Evandro, Ademir Caetano, afirmou à época no Instituto Médico-Legal (IML) de Paranaguá ter reconhecido o filho, por meio de uma pequena marca de nascença nas costas.

Conforme informações da época, o corpo estava sem o couro cabeludo, olhos, pele do rosto, partes dos dedos dos pés, mãos, com o ventre aberto e sem os órgãos internos.

Ademir Caetano também era funcionário público da cidade, ele trabalhava na prefeitura de Guaratuba. Maria e Ademir tinham outros dois filhos, Márcio e Júnior. Evandro era o caçula.

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